25 novembro 2009

A Arte de Discutir




  1. 5  bossito

    Discordo totalmente. A ideia do contrato alemão é excelente, e já praticada noutros países. É uma questão de transparência e honestidade. Parece-me essencial aliás criar um contrato comum europeu, tal com uma política de imigração comum, como espaço sem fronteiras que afinal é a UE.
    No fundo diz-se ao candidato a imigrante, as regras são estas, aceitas? Nada mais transparente e justo para ambas as partes.
    É claro que os valores de liberdade e igualdade (é isto sinistro Daniel?) não são unanimemente defendidos e respeitados por quem nasce alemão. Mas são-no pela maioria. E sim, há uma diferença entre nascer-se num país ou querer ir para lá viver. Um país não pode, nem deve expulsar os seus nacionais, e tem o direito de escolher quem pode para lá mudar-se.
    Regras de imigração mais justas, claras e transparentes é tudo o que a Europa precisa. Legalizações extraordinárias às três pancadas são por si só um problema. Nunca fora uma solução.


  2. 6  Daniel Oliveira

    bossito, estou boqueaberto com a tua posição. Não se trata dos valores serem bons ou maus. A todos a única coisa que se exige é que cumpram a lei. Não se fazem, em democracias, juras de condordância com valores. Cumprem-se na prática através da observância da lei. Com direito a discordar.


  3. 11  bossito

    Convém recordar que a comunidade turca na Alemanha veio nos anos 60 sem qualquer contrato, julgava a Alemanha a título temporário. É destes equívocos que nascem grande parte dos problemas de integração desta comunidade, cujo boom/nascimento não teve qualquer política pensada de integração. Os erros da Alemanha vêem-se por toda a Europa.
    Aos turcos que chegaram nos anos 60 nunca foi explicada a lei alemã à chegada. Mas não é isto o que faz o contrato? Explicar o essencial da lei do país, incluindo das leis não necessariamente escritas da sua sociedade?
    O Daniel quer que os imigrantes cumpram a lei, mas não lhes quer explicar antes de chegarem como funcionam as coisas? É isso justo? É isso transparente?
    O que é melhor, explicar ao candidato a imigrante guineense que em Portugal a mutilação genital é inaceitável e um crime grave, ou simplesmente mandar para a cadeia o imigrante que não sabia que agora estava mesmo noutro país.
    Não percebi ainda o seu problema. E sobretudo não percebi ainda que soluções oferece o Bloco de Esquerda para os problemas relacionados com esta questão.



  4. 13  Daniel Oliveira

    bossito, um contrato é bem mais do que uma mera explicação. O cumprimento da lei não precisa de um contrato. Ele existe desde o momento em que se entra num país, mesmo que apenas de visita. A questão é exigir aos imigrantes que concordem com valores que nem são aceites por todos os nacionais. É tirar aos imigrantes um dos fundamentos da democracia: o confronto entre valores diferentes. Sendo que com o contrato não vêm direitos políticos. Apenas obediência.


  5. 14  bossito

    Tanto quanto sei o tal contrato explica também os direitos dos imigrantes. É um contrato com das partes, o imigrante e o estado alemão, sendo que dele virá o direito mais importante para o imigrante, o direito à imigração.
    É claro que a lei de um país também se aplica aos visitantes, mas não quer comparar o turista de passagem, com alguém que quer construir a sua vida num país. Emigrar é uma escolha, e todos ganham se essa escolha é transparente e informada. Ninguém é obrigado a emigrar – se é, não é emigrante, é refugiado – por isso um estado tem o direito de exigir ao emigrante algo que não pode exigir aos nacionais.
    A lei alemã defende a igualdade entre homens e mulheres e a liberdade de imprensa, quer emigrar para a Alemanha? Concorda com estes valores? É isto injusto porquê? Se não gosta dos valores, não emigre para a Alemanha. É por essa razão que eu emigrei para aqui p.ex., e não emigraria para ene países por esse mundo fora…


  6. 15  bossito

    Julgava eu aliás, que isso de emigrar com o intuito de levar valores diferentes e propaga-los não se chamava emigração, mas colonização.


  7. 16  Daniel Oliveira

    bossito, e se isso se aplicar ao contrário? Pode? O português que vá viver para Angola tem de declarar que concorda com os valores dominantes em Angola ou basta-lhe cumprir a lei? E se o senhor for viver, como tantos europeus vão, para a própria Arábia Saudita? Devem declarar por escrito que concordam com os valores que dominam aquele país ou basta-lhes cumprir a lei daquele país enquanto lá estão? Não está a ver a diferença entre aceitar uma lei ou ser coagido a aderir a valores?
    Porque raio não pode uma pessoa ser, como tantos alemães, contra a igualdade entre homens e mulheres e viver na Alemanha? Desde que cumpra a lei, que raio de rastreio ideológico é este? E depois? Terão de assinar um papel a dizer que são contra a homofobia? E contra o comunismo? E contra o desrespeito pelo ambiente? Onde acaba?


  8. 17  Daniel Oliveira

    bossito, eu acredito no cosmopolitsmo e no confronto permanente de valores. A imigração passiva e a colonização são apenas duas faces da mesma moeda autosuficiente. Recordar que alguns dos valores que consideramos nossos vieram com outros que nos visitaram, ocuparam, imigraram…


  9. 18  bossito

    E qual é o problema Daniel? Cabe-lhe a si, ou a mim, decidir emigrar ou não para esses destinos. Aceitar uma lei, sobretudo quando não se é obrigado a respeita-la – bastando para tal não emigrar – implica desde logo uma concordância mínima com os valores que lhes estão subjacentes. De novo, não falamos do turista de visita, mas de alguém que se quer mudar e construir uma vida noutro país.
    Depois estamos aqui a comparar o incomparável, a tratar a defesa da liberdade de expressão e igualdade no mesmo nível da ausência de liberdade e igualdade da Arábia Saudita. Acha que isso faz sentido? Que é comparável. Simétricos?


  10. 19  bossito

    Já eu acredito que valores há que são maiores, que precisamente distinguem sociedades democráticas das outras. E de cuja defesa depende a continuação dessa mesma democracia. Entre a Alemanha e a Arábia Saudita eu não sou neutro.
    E gostaria muito que o Daniel explicasse o seu modelo de imigração. De preferência um que se entenda e que seja sustentável. E não o da imprevisibilidade, como é o português e europeu em geral.
    Dou desde já um exemplo que me parece justo e exemplar, mesmo tendo significado – para já – uma impossibilidade de emigração para mim próprio: o Canadá.



  11. 21  Daniel Oliveira

    Se não nos queremos transformar na Arábia Saudita, faz. Porque um dos valores que temos de defender é o da liberdade de consciência. E se o tiramos aos imigrantes nenhuma razão moral existirá para não o tirarmos um dia aos nacionais. A lei é igual para todos. E ela baseia-se em valores. Na consciência não mandamos nem podemos mandar. Nós legislamos sobre a acção, não podemos nem devemos legislar sobre o pensamento. Nem o nosso, nem o dos imigrantes, nem o de ninguém.



  12. 23  Daniel Oliveira

    bossita, a defesa da sociedade democrática faz-se pela acção democrática. E ela distingue-se não copiando tiques de sociedades não democráticas.
    Eu também não sou neutro entre diferentes tipos de regime (quanto às sociedades, talvez não fosse mau recoar um pouco na memória). Por isso defendo que as sociedades democráticas são mais exigentes consigo próprias.




  13. 25  Daniel Oliveira

    Passionaria, em Berlim fiquei num bairro com uma percentagem assinalavel de turcos e senti-me muito bem. Aliás, na própria turquia senti-me muito bem.
    De facto, as frases que se dizem como se não fosse nada.


  14. 26  bossito

    Quando falamos de liberdade de expressão ou de igualdade de direitos entre os sexos estamos a falar de princípios basilares do atual estado alemão. Se não concorda com estes princípios não deve vir morar para a Alemanha. É tão simples quanto isto. E nisto, quem diz Alemanha, diz Portugal.
    Se recuarmos na memória, lembrar-nos-emos dos tempos em que estes princípios não eram defendidos. Uma razão mais para exigir a quem venha, que os defenda como condição para cá viver.



O que se faz nesta caixa de comentários é "a" discussão que se tem de ter na Europa e já! O bossito demonstra uma argumentação que para mim é o essencial em qualquer discussão. Não só critica uma posição, como lhe contrapõe soluções diversas, exortando o Daniel Oliveira a que apresente outro modelo. Este não o faz, o que demonstra a falta de modelos para quem defende a "tolerância absoluta". Já para não falar na falsa distinção entre aceitar uma lei e não concordar com ela e aqui voltamos à discussão que fez renascer este blog. Eu não acho possível ir à Arábia Saudita discordando do seu modo de vida (leis, valores e costumes) e aceitando-o ao mesmo tempo. Ser tolerante e absolutamente justo é ficar em casa e não compactuar ou falsamente aceitar esse modo de vida.


2 comentários:

Petit Bourgeois@Villa disse...

Basta cumprir a lei. Ninguém tem que ver com o que se passa na minha cabeça. Tolerância é ter direito a este tipo tipo de reserva mental. Intolerância é a geografia ditar o que penso. Se não destrato alguém porque a lei do país me impede, ainda que eu esteja a morrer de vontade, não há problema, sou apenas, provavelmente, mau ou menos "civilizado".

Mas para ilustrar este caso, não é preciso pensar em emigrar, ele acontece em todos os países, no preciso sítio onde está.

E daí ser reconhecido na doutrina que esta espécie de hipocrisia forçada é essencial à sociedade democrática.

Que se assinem os contratos " de valores" todos e depois que alguém explique o valor desse contrato. O alemão viola a lei, o emigrante viola o contrato. Matou alguém? Sim, violou o contrato. Os outros, os que não assinam, violam a lei penal? Ou viola ambos? E a lei penal não chegava?

O contrato é juridicamente idiota por não estar o Direito habilitado - como nunca esteve - a regular matérias de pensamento. Simplesmente é impossível. Quem era contra o aborto não passou a aderir aos fundamentos subjacentes ao "sim" com a mudança da lei. A aposição da assinatura num contrato não implica mudança alguma. Um contrato regula aspectos psicológicos (coisa inquisitorial), e a única prova possível é o comportamento?

Se eu fosse alemão, exigia imediatamente um contrato para mim também. Fico psicologicamente muito mais descansado com o incumprimento de um contrato que com o incumprimento da lei. Prisão? Mas eu só violei um contrato! Ahh é um contrato especial! E é um contrato de adesão? Como se esses contratos não fossem já suficientemente problemáticos. Afinal é uma lei, não passa de uma lei, da qual se exige o conhecimento do emigrante e finge-se que uma assinatura é suficiente como para o "consentimento informado", esse também quase sempre pouco informado e pouco consentido.

Se eu quiser ir à Arábia Saudita vou. Cumpro a lei do país. Nada mais me pode ser exigido, por muito que lamente a situação. Mais: slippery slope: que afinal se pode exigir? Se for aos EUA sou obrigado a aderir psicologicamente à espécie americana de liberalismo económico? Aliás, se for a nova Iorque adiro a uma coisa, mas se for ao Tennessee a outra? Numa não me é indiferente, noutra é me indiferente que haja um regime que permita o enriquecimento de uma forma tão desinibida só permitida pela ausência de protecção social?

A qualificação do viajante como hipócrita implica a obrigação moral de se ser uma coisa hoje e outra amanhã pelo simples facto de se cruzar uma fronteira tantas vezes (senão todas) artificiais.

Petit Bourgeois@Villa disse...

p.s.: e o que isso de "aceitar" as leis?